Fidel
e a religião, livro contendo longa entrevista que fiz com o líder cubano,
em 1985, acaba de ser reeditado no Brasil pela Fontanar, selo da Companhia das
Letras.
A obra vendeu 1,3 milhão de exemplares em Cuba, mereceu traduções para 20
idiomas e edições em 32 países. Foi o presente de Fidel ao papa Francisco em
visita a Havana, em setembro de 2015. Seu impacto favoreceu a liberdade
religiosa em países socialistas. Foi a primeira vez que um chefe de Estado
comunista se manifestou positivamente sobre o fenômeno religioso. Isso no
momento em que a Nicarágua sandinista havia incluído os cristãos no processo
revolucionário que derrubou a ditadura da família Somoza, em 1979.
Na União Soviética e nos países socialistas do Leste europeu, a falta de
liberdade religiosa aprofundou as rachaduras na Cortina de Ferro e no Muro de
Berlim, que desabaram em 1989. Quatro anos antes Fidel, na entrevista, alertou
os dirigentes comunistas quanto ao erro de identificar capitalismo e
cristianismo, considerar a religião mero “ópio do povo” e restringir a
manifestação da fé aos templos e à privacidade doméstica.
Tais preconceitos contribuíram para acentuar as contradições entre sociedade
política e sociedade civil. Enquanto esta abraçava a religião como esfera
emblemática de liberdade de consciência, nas escolas era ensinado o “ateísmo
científico” e pessoas dotadas de fé estavam proibidas de se filiar ao Partido
Comunista, ocupar cargos administrativos e trabalhar como professor, filósofo,
psicólogo, agente de segurança pública etc.
Devido à repercussão do livro, fui convidado a assessorar governos socialistas
na aproximação Estado e Igrejas. Estive na China, Rússia, Letônia, Lituânia,
Tchecoslováquia, Polônia e Alemanha Oriental. Tarde demais. Como a água que se
avoluma no tsunami, os anseios de liberdade da sociedade civil fizeram
naufragar a sociedade política. Descrevo esses anos de delicada costura entre
Estado e Igreja em Paraíso perdido – viagens ao mundo socialista (Rocco).
A nova edição de Fidel e a religião resitua o leitor graças ao
prólogo atualizado. Foi enriquecida também com notas que contextualizam as
informações contidas no texto, já que desde 1989 desapareceu a bipolaridade
entre capitalismo e comunismo, enquanto a Guerra Fria se reduz, hoje, às
tensões econômicas e estratégicas nas áreas de influência dos EUA, da China e
da Rússia.
O que torna Fidel e a religião uma obra inaudita é, como me
disse um bispo, “tirar o medo dos cristãos e o preconceito dos comunistas.” Mas
não somente por isso. Também por resgatar a utopia em um mundo que dá sinais de
trocar a liberdade por segurança, e enfatizar o caráter libertador da fé cristã
quando tantos proclamam a “morte de Deus” ou insistem, no bazar das crendices,
em torná-la de fato “ópio do povo” e cornucópia da fortuna de supostos
pastores.
Fidel e a Religião foi lançado no Rio de Janeiro, nessa segunda-feira, 11 de julho. O lançamento em São Paulo acontecerá na próxima segunda-feira, 18 de julho, no Esch Café, Alameda Lorena 1899.
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